Uma última carta pra você

 Eu tinha prometido pra mim mesma que não ia te escrever mais. Mas hoje acho que preciso, mesmo 
que você não leia nunca, ou só daqui a muito tempo. 

Hoje ele se foi. 

Lembra quando ele chegou? A gente salvou um mundo. E hoje, o fim do mundo chegou.

Não é sobre você, sabe. É sobre aquele mundo que existiu. Eu achei que ele tivesse acabado em janeiro de 2021. Mas uma parte dele, linda, perfeita, mágica, resistiu e viveu da melhor maneira que eu pude dar. Eu vivi com ele e ele viveu comigo. Eu tive a sorte de ter mais dois anos com ele. Dois anos mais que você. Não estou me gabando. Só um fato. E sorte minha que eu decidi trazer ele comigo.

Ele foi bom o tempo todo. Ele foi melhor pra mim que eu pra ele e ele nunca vai ter essa noção. 

Nas últimas semanas ele tava bem ruinzinho. E mesmo quando ele tinha que passar o dia inteiro só, quando eu chegava, ele tinha sido o melhor cachorro do mundo. Um Santo.  Nada daquilo de tá tudo um caos. 

Eu tenho certeza que ele sabia que minha vida fora de casa tava um caos e ele se esforçava pra não ser caos. 

Às vezes eu perdia a paciência e me sentia tão mal. Meu deus, a culpa. Ele merecia melhor que eu. 

Lembra quando eu decidi resgatar ele? Eu estava tão só. E eu fui uma egoísta querendo ele só pra me fazer a companhia que você não fazia. Mal sabia eu que, apesar de nunca confundir nossos lugares, inclusive como humana/cachorro, ele se tornou um verdadeiro companheiro. Eu posso dizer com plena convicção que eu tive uma experiência de conexão com outro ser tão puro quanto podia ser. Com todos os meus defeitos. E ele não tinha nenhum. Mesmo com frescura pra comer, com aqueles choros subsônicos. Eu posso morrer sabendo que amei! Amei puramente. Amei com tudo o que podia. Abri mão de momentos, de oportunidades, de viagens... tudo pra não falhar com ele. Ele era meu e eu era dele. Doido né... pq ele não era nada mais que meu cachorro. Não era filho. Deus, não! 

E hoje, o espaço vazio no tempo dedicados aos seus passeios, horas do meu dia, estão aqui, me encarando rudemente. Eu não encaro de volta porque eu vou desabar. O que vou fazer com isso? Esse tempo eu não queria de volta. Mas eles iriam ser né? Quem eu queria enganar. Ele tinha quase 16 anos, pelas nossas suposições. 

Ele foi bom. Ele era todo bom. 

E não importa se não existir. Será criado um lugar no além só pra que ele inaugure. 

Mentira, Kika já ta lá. 

Meu deus, como eu tive sorte. Como a gente não os merece. 

Enfim... Sei que você já teve esse luto. E foi por causa de uma decisão unilateral minha. E talvez você não queira outro. Por isso deixo aqui. 

Ele descansou. Ele viveu.


 

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